Em Portugal, a tradição repete-se um pouco por todo o país, embora nas grandes cidades tudo se passe numa atmosfera essencialmente cosmopolita.
As ruas iluminam-se de lâmpadas translúcidas e cintilantes como auroras boreais. Montras vestidas de vermelho, doirado ou prateado prendem os olhares. O país torna-se feérico por alguns dias!
Esquecem-se os dias tristonhos e gélidos, pessoas enchem os passeios, umas apressadas nas compras, outras apenas no simples prazer de desfrutar desta quadra festiva. Dir-se-ia que as luzes trémulas aquecem os corações mais cépticos e solitários.
No dia vinte e quatro ao final da tarde, toda a família se reúne. Alguns deixam as cidades e partem para o campo. Outros atravessam o mundo para voltar ao seu país, por poucas horas. Fazem-no com a esperança de reviver lembranças de uma vida.
Sensivelmente por volta das vinte e uma horas, a grande família reencontra-se à mesa: bombons de cores e sabores variados para os mais pequenos, frutos secos e cristalizados para os mais crescidos.
A luz das velas imprime uma tonalidade mais intimista, bem adequada à ceia de Natal!
Como entrada, os apetitosos bolinhos de bacalhau com verduras salteadas. Segue-se o tradicional «Bacalhau à Portuguesa»: bacalhau cozido, batatas, couve portuguesa, cenouras e ovos. Tudo, acompanhado generosamente pelo bom azeite, comprado nas lojas de comércio tradicional ou enviado da província por familiares e amigos.
Chega então a sobremesa! Uma enorme mesa, pródiga das mais belas iguarias da doçaria portuguesa: rabanadas, aletria polvilhada e aromatizada com canela, farofas, fios de ovos, sonhos, pudim conventual de ovos... Excêntricos requintes para o paladar!
O célebre Bolo-Rei partilha desta tradição e os mais velhos e apreciadores acompanham-no com um cálice de perfumado vinho do Porto.
À meia-noite, tocam à porta... e o Pai Natal - um familiar disfarçado por trás de uma longa barba branca e vestido a rigor - faz a sua entrada, soltando o tradicional e esfuziante:
- Ho! Ho! Ho!
Os miúdos despertam, e enchem os olhos de estrelas brilhantes. Os gritos de espanto, alegria e excitação espalham-se pela casa. É o momento mais belo da noite! A hora do encantamento!!
Depois, cada um regressa a suas casas...
A mesa deixa-se posta e guarnecida. Dizem os mais antigos que durante a noite o espírito dos familiares desaparecidos regressa para partilhar desta doce reunião.
Há pessoas que saem, percorrendo as ruas frias. Num gesto de fraternidade recatada tentam aquecer a noite dos que dormem à luz da Estrela de Natal!
O frio gela... mas as mãos aquecem nos afectos e os olhos transformam-se em estrelas tremulares de mil tons e transparências de cristais.
Para todos os que poisarem por aqui suas emoções... Feliz Natal!
Miosótis (pseudónimo)
escrito no Natal 2004
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22.12.2006