Como todos sabemos, celebra-se hoje, dia 23 Abril, O Dia Mundial do Livro e do Direito de Autor.
Livros! Tudo o que nos preenhe a alma, em horas de lazer, de tristeza, e até de alegria. O livro é a extensão da nossa alma. Tal como a música.
"Dos diversos instrumentos utilizados pelo Homem, o mais espetacular é, sem dúvida, o livro. As demais são extensões de seu corpo. O microscópio, o telescópio são extensões de sua visão; o telefone é a extensão de sua voz; em seguida, temos o arado e a espada, extensões de seu braço. O livro, porém, é outra coisa: o livro é uma extensão da memória e da imaginação".
Jorge Luis Borges, in “Cinco Visões Pessoais”
No Dia Mundial do Livro, evoco dois dos autores portugueses, dos cinco cujo Centenário de nascimento se celebra ao longo de 2023: Natália Correia e Eugénio de Andrade. Dilectos na leitura.
Pusemos tanto azul nessa distância
ancorada em incerta claridade
e ficamos nas paredes do vento
a escorrer para tudo o que ele invade.
Pusemos tantas flores nas horas breves
que secam folhas nas árvores dos dedos.
E ficámos cingidos nas estátuas
a morder-nos na carne dum segredo.
Natália Correia, O Livro dos Amantes IX
Lembrar teus carinhos induz
a ter existido um pomar
intangíveis laranjas de luz
laranjas que apetece roubar.
Teu luar de ontem na cintura
é ainda o vestido que trago
seda imaterial seda pura
de criança afogada no lago.
Os motores que entre nós aceleram
os vazios comboios do sonho
das mulheres que estão à espera
são o único luto que ponho.
Natália Correia, Bilhete para o Amigo Ausente
in a O Vinho e a Lira
Sei agora como nasceu a alegria,
como nasce o vento entre barcos de papel,
como nasce a água ou o amor
quando a juventude não é uma lágrima.
É primeiro só um rumor de espuma
à roda do corpo que desperta,
sílaba espessa, beijo acumulado,
amanhecer de pássaros no sangue.
É subitamente um grito,
um grito apertado nos dentes,
galope de cavalos num horizonte
onde o mar é diurno e sem palavras.
Falei de tudo quanto amei.
De coisas que te dou
para que tu as ames comigo:
a juventude, o vento e as areias.
Eugénio de Andrade, “Até Amanhã“,
in “Até Amanhã”, 1956
O amor
é uma ave a tremer
nas mãos de uma criança.
Serve-se de palavras
por ignorar
que as manhãs mais limpas
não têm voz.
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